Na noite de 17 de julho de 2007, o Brasil assistiu, estarrecido, a um dos episódios mais trágicos da história da aviação nacional. O voo TAM 3054, que fazia a rota Porto Alegre – São Paulo (Congonhas), colidiu contra um prédio da própria companhia e um posto de combustível após tentar pousar na pista principal do aeroporto. O resultado: 199 mortos e uma ferida profunda na confiança dos passageiros e na imagem da aviação brasileira.
A tragédia, que chocou o mundo, levantou uma questão que ecoa até hoje: teria sido uma fatalidade inevitável ou uma tragédia anunciada, consequência de falhas conhecidas e negligenciadas?
O voo que não parou
O Airbus A320 da TAM pousou em Congonhas às 18h45 sob chuva intensa. A pista, recém-reformada, ainda não tinha ranhuras de drenagem (grooving), o que tornava o solo extremamente escorregadio. Além disso, uma das manetes de potência (aceleradores) do avião estava configurada em posição de decolagem, enquanto a outra estava em posição de reverso — um erro crítico que fez a aeronave não desacelerar.
O avião avançou além do limite da pista, atravessou a Avenida Washington Luís, bateu em um prédio da TAM Express e explodiu. Em segundos, uma bola de fogo iluminou a noite paulistana. O fogo foi tão intenso que o resgate teve extrema dificuldade em identificar as vítimas.
Alertas ignorados
O acidente do voo 3054 não surgiu do nada. Vários alertas haviam sido feitos por especialistas e pilotos sobre o risco de operar em Congonhas durante chuva.
Nos meses anteriores, outros aviões já haviam derrapado nas pistas escorregadias do aeroporto. O Sindicato Nacional dos Aeronautas chegou a pedir restrições de pousos em condições de chuva forte, mas nada foi feito.
Além disso, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Infraero foram criticadas por permitir operações intensas mesmo durante obras e sem o grooving, um recurso básico de segurança.
Para muitos, o acidente era uma tragédia anunciada — o resultado previsível de uma soma de descuidos, pressões econômicas e confiança excessiva na sorte.
A investigação e as conclusões
A investigação conduzida pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) concluiu que o acidente foi causado por uma combinação de fatores:
Erro na configuração dos manetes do avião;Pista molhada e sem grooving;Falta de treinamento adequado sobre aquele tipo de falha;Decisões gerenciais e regulatórias questionáveis.
A Airbus e a TAM também foram responsabilizadas por não reforçarem o treinamento dos pilotos para esse tipo de situação específica. Ainda assim, nenhuma autoridade pública foi condenada criminalmente.
A tragédia evidenciou falhas sistêmicas na aviação brasileira, indo muito além de um simples erro humano.
Entre o erro e o destino
A sociedade se dividiu: muitos enxergaram no acidente um erro técnico trágico, resultado de um detalhe infeliz somado a um ambiente adverso. Outros sustentam que foi uma tragédia anunciada, fruto da negligência e da pressa em manter o lucro e o fluxo aéreo, mesmo diante de riscos claros.
O caso do TAM 3054 permanece como símbolo do preço da omissão, um lembrete amargo de que a segurança nunca deve ser sacrificada em nome da conveniência.
Legado e mudanças
Após o acidente, o Brasil adotou uma série de medidas de segurança:As pistas de Congonhas receberam novas ranhuras e sistemas de drenagem;Foram revisadas normas de operação em pista molhada;As companhias reforçaram treinamentos de emergência e simulações.
O trauma coletivo foi tamanho que levou anos para o público recuperar a confiança em voar. O prédio da TAM Express, destruído na colisão, virou um memorial das vítimas, símbolo da dor e da necessidade de nunca esquecer.
Reflexão final
A tragédia do voo TAM 3054 mostrou que, na aviação — como em tantas áreas —, não existe erro isolado. Quando pequenas falhas se alinham, o resultado pode ser devastador.
Mais do que um acidente, foi um alerta gravado em fogo e lágrimas sobre a importância da responsabilidade, da transparência e da vida humana acima de qualquer cronograma.
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