A catarata congênita pode provocar mudanças anatômicas e funcionais nas vias ópticas, ambliopia, possivelmente irreversível, e cegueira, caso a criança não receba intervenção apropriada
Para adultos e crianças maiores que se submetem à cirurgia de catarata, o implante de uma lente intraocular, após a retirada do cristalino, é padrão. Mas um estudo, publicado no Jama Ophtalmology, sugere que, para a maioria das crianças pequenas, a cirurgia, seguida pela utilização de lentes de contato durante alguns anos e um implante intraocular, posteriormente, pode ser a melhor solução.
“A catarata é a opacificação do cristalino, que pode ser removida através de um procedimento cirúrgico seguro e rápido. Após a remoção da catarata, a maioria dos pacientes, incluindo adultos e crianças, recebe uma lente artificial permanente chamada de lente intraocular (LIO). Esta é uma opção terapêutica disponível para as crianças também, mas o estudoconstatou que o uso de lentes de contato é mais seguro e tão eficaz quanto as LIOs, quando os pacientes são bebês com menos de sete meses de idade”, afirma o oftalmologista Virgílio Centurion (CRM-SP 13.454), diretor do IMO, Instituto de Moléstias Oculares.
Quando os pesquisadores começaram o estudo, a teoria predominante era de que as LIOs seriam a melhor opção para o tratamento da catarata em crianças porque elas corrigem a visão constantemente, enquanto as lentes de contato podem ser removidas ou desalojadas do olho. Mas os dados coletados pelos pesquisadores revelaram que, para a família, as lentes de contato são a melhor opção terapêutica até que a criança fique mais velha. Pois a família precisa se sentir participante do processo de recuperação da criança, controlando o uso das lentes de contato.
Centurion destaca que embora a catarata, na maioria das vezes, esteja relacionada ao envelhecimento, estima-se que,mundialmente, a catarata congênita tenha uma incidência de 0,4% na população geral e cerca de 12% nos portadores da síndrome de Down. “Estudos mostram que a incidência da catarata congênita varia de 1,2 até 6/10.000 nas diversas regiões do mundo. Nos Estados Unidos, epidemiologistas estudaram a prevalência da catarata congênita, chegando a um resultado de 3,0 a 4,5 casos por 10.000 nascidos vivos. No Brasil, esse tipo de catarata é uma das causas mais frequentes de cegueira na infância, respondendo por uma incidência de 5,5-12% em pacientes portadores de visão subnormal”, diz o médico.
A catarata na infância
A catarata na infância pode ser classificada de acordo com a época do seu aparecimento:
· Catarata congênita, presente do nascimento até os 3 meses de vida;
· Catarata infantil precoce, presente após 3 meses de vida;
· Catarata infantil tardia, presente após os 12 meses de vida.
“Existem várias possibilidades para o surgimento da catarata infantil: ela pode ser um achado isolado, consequência de infecção intrauterina, com o vírus da rubéola como principal agente; pode estar relacionada a síndromes, sendo a mais comum a de Down; associada a malformações oculares ou sistêmicas; e ainda apresentar um caráter genético. Também pode ocorrer em crianças prematuras e com uveítes”, detalha o oftalmologista Virgílio Centurion, que é membro daALACCSA, Associação Latino-Americana de Cirurgiões de Córnea, Catarata e Cirurgias Refrativas.
Por ser uma causa comprovada de cegueira infantil e por requerer diagnóstico precoce e tratamento cirúrgico imediato, a catarata congênita merece atenção dos profissionais de saúde envolvidos no momento do nascimento do bebê. A condição pode afetar ambos os olhos, mas, na maioria dos casos, afeta apenas um, sendo assim chamada de catarata unilateral. O novo estudo comparou o uso de lentes intraoculares em relação ao uso de lentes de contato, durante a infância, no tratamento da catarata congênita unilateral.
Pesquisas anteriores sugeriram que o uso de uma LIO para tratar a catarata durante a infância poderia melhorar os resultados visuais de longo prazo. As LIOs também podem poupar bebês e seus pais do desconforto das variações diárias provocadas na visão pelas lentes de contato, além de reduzir o risco da introdução de germes dentro do olho.
“Por outro lado, o uso de LIOs durante a infância, também tem apresenta suas desvantagens. Os cirurgiões oculares têm dificuldades para estabelecer apropriadamente a multifocalidade da lente artificial para uma criança, porque esse é um momento de rápido crescimento dos olhos. Como o olho cresce da parte frontal para a parte de trás, a lente muda de forma para compensar o crescimento do eixo do olho. Quando fazemos a cirurgia de catarata, estamos interrompendo esse crescimento e alterando a refração, portanto devemos fazer o planejamento levando esse fato em consideração e isso pode ser muito difícil de prever. Além disso, enquanto os implantes intraoculares são tipicamente seguros para os adultos e não apresentam complicações, eles são mais propensos a causar problemas pós-operatórios nas crianças”, pondera Virgílio Centurion.
Riscos x benefícios das LIOs
Como a cirurgia de catarata e a utilização das LIOs para lactentes se popularizaram ao longo do tempo, o estudo buscou determinar se os efeitos benéficos das LIOs superam suas complicações conhecidas.
O estudo começou em 2004 e envolveu 12 centros clínicos, onde foram recrutados bebês com catarata em um dos olhos. Os pais que buscavam essas clínicas foram informados sobre o estudo e sobre os potenciais benefícios e riscos da cirurgia de catarata com e sem uma LIO. O estudo, em última análise, reuniu dados de 114 bebês, entre 1 e 6 meses de idade no momento da cirurgia. Por designação aleatória, cerca de metade dos bebês recebeu uma LIO e a outra metade recebeu lentes de contato.
Os bebês participantes do estudo agora são crianças e os pesquisadores examinaram sua acuidade visual, em duas ocasiões. As crianças, quando completaram 1 ano de idade, foram testadas com Cartões de Acuidade de Teller (CAT). O teste avalia a acuidade visual, principalmente em crianças pré-verbais e outros pacientes que apresentam limitações para realização dos outros testes tradicionais de quantificação da acuidade visual. Aos 4 1/2 anos de idade, as crianças foram avaliadas novamente por meio do teste HOTV, que pode ser aplicado em crianças pré-alfabetizadas.
Não houve diferenças significativas na acuidade visual entre os dois grupos nem no primeiro ano de vida, nem aos 04 anos. No entanto, houve mais complicações pós-cirúrgicas no grupo que usava LIOs, o que levou a mais cirurgias corretivas. A complicação mais frequente foi a opacificação do saco capsular, local onde se implanta a LIO. Aos 5 anos, a opacificação capsular era 10 vezes mais comum nas LIOs, ocorrendo em 23 (40%) crianças, em comparação com duas crianças (4%) no grupo das lentes de contato. Esta complicação e outras levaram à necessidade de uma ou mais cirurgias no olho entre 41 (72%) crianças do grupo LIO e 12 (21%) no grupo de lente de contato.
Aos 5 anos, nove crianças no grupo de lente de contato desenvolveram infecções oculares que foram tratadas com colírios antibióticos, e em uma criança, uma lente de contato quebrou durante a utilização. Nenhum desses problemas teve efeitos permanentes na visão. Três crianças no grupo de lente de contato fizeram o implante de LIO, antes dos 5 anos de idade, porque suas famílias tiveram dificuldades com o dia-a-dia: mudança de lentes de contato e manutenção.
Os pesquisadores concluíram que para a maioria das crianças com catarata unilateral, as lentes de contato foram uma opção melhor do que uma LIO. “No entanto, em alguns casos, os pais e o oftalmologista podem decidir que o uso de lentes de contato pode ser muito desafiador, e, não é o melhor para a criança”, observa o diretor do IMO.
Centurion destaca que além do desconforto potencial para a criança e da ansiedade dos pais, pode haver desafios menos óbvios em relação ao uso das lentes de contato na infância. “A catarata congênita é, por vezes, hereditária, o que significa que alguns pais podem ter seus próprios problemas de visão, o que torna mais difícil fazer a adaptação das lentes de contato em seus filhos”, diz o médico.
“Diante de um cenário que apresenta dificuldades em relação às duas opções terapêuticas, muitos pais podem desejar adiar tanto a cirurgia de catarata quanto a implantação das lentes intraoculares. No entanto, mesmo diante das dificuldades, é preciso agir rápido. No caso da catarata congênita, a intervenção precoce é essencial. O momento ideal é, no máximo, entre a terceira e a sexta semana de vida, porque aguardar mais pode ter um efeito devastador no desenvolvimento visual da criança”, alerta o oftalmologista.
Para saber mais sobre catarata congênita, acesse um vídeo sobre o tema:
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